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  • Foto do escritorBruno França

Kool Metal Fest: redefinindo o que é o Carnaval

O Kool Metal Fest (doravante conhecido como "Kool") já pode ser considerado um marco temporal na cena do Metal nacional



Momentos registrados durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Momentos registrados durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Uma característica notável do Kool, realizado no domingo de carnaval, 11 de fevereiro — é que, ao contrário de quase todos os eventos existentes do ramo, ele ocorre mais de uma vez ao ano: seja gratuito, seja pago.


Em um país com ações profundamente enraizadas em afinidade com uma de suas principais atividades festivas, o Carnaval, era de se imaginar que seria algo "fora de lugar" um festival como este ocorrer no exato final de semana da supramencionada data comemorativa.


No entanto, não é à toa que a capital paulista é o epicentro da diversidade cultural no Brasil, ao demonstrar uma vez mais que há espaço disponível para um autêntico ode ao Thrash Metal, independente da época.



Santa Muerte


Momentos registrados durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Momentos registrados durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Pontualmente às 14:45, os portões do Inferno foram abertos com a abertura do Crossover/Thrash da banda Santa Muerte. A dupla composta por Jhully Souza e Marília Massaro (as membras efetivas, que conta com uma adição quando estão num show) iniciou com estilo o ataque sonoro no Carioca Club.


Mesmo com uma aglomeração tímida de pessoas, aqueles que chegaram cedo foram agraciados com uma apresentação explosiva, do EP 'Psychollic' tocado em sua totalidade, junto com o single de 2019 "Hipocrisia Never Ends", algo digno dos apreciadores do estilo, que também conta com pegadas punk em seu som.


Logo de cara, a qualidade sonora dos falantes se manteve lá no alto, reforçando a reputação que a casa possui para ser uma anfitriã de renome na 'Cidade Que Nunca Dorme'.


A presença delas é um testamento da constante aparição feminina na cena do Metal, e ajudou a satisfazer a necessidade dos presentes, clamando por aquela agressão diferenciada que o Thrash proporciona.


Baterista do Santa Muerte durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Baterista do Santa Muerte durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Repertório


1) Scars of Guilty

2) Survive Or Live

3) Personal Hell

4) Circulo de Sangre

5) Cyco Pit

6) Hipocrisia Never Ends

7) Trap On Track

8) Reactions



Cerberus Attack


Com o assalto contínuo não podendo parar, era hora do Cerberus Attack prosseguir com um Thrash atirado na sua cara e bem cru, arquitetado por Jhon França (baterista da Eskröta, que realizou uma aparição fantástica em uma das edições do Kool de 2022).


Cerberus Attack durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Cerberus Attack durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Em linha com uma característica desde a concepção do gênero, toda a apresentação esteve envolvida com letras pesadamente orientadas por uma linha política. Foi visto aqui o estabelecimento de um ritmo que não iria diminuir até o final da noite, em boa parte pelo repertório ter sido dominado pelo lançamento mais recente, "Abyss of Lost Souls".


O festival ainda iria continuar e ainda tinham pessoas chegando, mas quem chegou para acompanhar tudo pôde receber doses cavalares de petardos na forma de áudio capazes de despertar até mesmo um zumbi, com faixas como "Fastest Way to Die" e "Third World Kids", com direito a uma homenagem ao Kiss ao tocarem um trecho de "Detroit Rock City".


Cerberus Attack durante o Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Cerberus Attack no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Repertório


1) Straight Outta East Side

2) Strategic Cut On Education

3) Mithify Yourself

4) Fastest Way To Die

5) Third World Kids

6) Duck Parade

7) Moshers

8) Harbinger of Decay



Escalpo


A terceira banda a se apresentar foi a mais nova entre as programadas, nascida na época da maior tragédia sanitária das últimas décadas, durante o ano de 2020.


Banda Escalpo no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Banda Escalpo no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

A idade da banda é um mero detalhe, pois os membros já carregam notória bagagem. Com um Metalpunk direto e agressivo, o Escalpo se sentiu em casa, tocando músicas cantadas em bom Português. Durante o show, um acontecimento se mostrou presente de maneira ocasional e que seria uma constante na última banda do Kool: o vocalista se posicionou no degrau menor do palco, ficando mais próximo da multidão.


Invocando uma clara "desordem da ordem" e um inconformismo diante do cenário sócio-político, a performance foi violenta do primeiro até o último segundo, com mais pessoas vindo da parte externa da casa para a parte de dentro para curtirem o som, cujo repertório viu o álbum ".I.", do ano passado, ser reproduzido quase por completo.


Banda Escalpo no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Banda Escalpo no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Repertório


1) Onda de Estupidez

2) Olhando pro Chão

3) Eviscerando O Opressor

4) Desconstrução/Destruição

5) A Dor do Açoite

6) Escravidão Autoimposta

7) Retrocedendo

8) Desumanização



Damn Youth


Banda Escalpo no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Damn Youth no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Aqui é quando surge um aumento considerável da multidão ao recepcionar o final da primeira parte do festival, entregue pelo Damn Youth. Durante a apresentação da banda vinda do Ceará, a plateia começou a realizar uma movimentação perceptível para curtir apropriadamente os shows, com um moshpit mais presente e com o surgimento dos primeiros stagedives.


O quarteto era a personificação de uma animação em formato humano, com movimentações constantes dos membros ao redor do palco, fazendo com que os fotógrafos apelassem para uma camada extra de habilidade para capturarem com precisão os registros tirados do Kool.


O caos foi realmente espalhado na hora em que "Your Leader Will Fall" foi anunciada, mostrando uma ferocidade que remete ao Thrash old-school do final dos anos 80, pegando de surpresa os que não estavam familiarizados com os cearenses, detentores de um espírito de sobra.

O métrico foi elevado já no começo durante esta performance agitada, e um encerramento mais do que justo desta revelação do Thrash/Crossover. Do Nordeste, com amor.


Damn Youth no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Damn Youth no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Repertório


1) Senseless Massacre

2) Restitution

3) Straight Line

4) No Hero

5) Your Leader Will Fall

6) Descends Into Disorder

7) Jurisdiction

8) Oppression Breeds Rebellion

9) Progress?!

10) Sociopath Corporation of Surveillance

11) No Mercy To Nazi Sympathy



Ratos de Porão


Ratos de Porão no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Ratos de Porão no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Os veteranos paulistas com sangue brasileiro e com mais de 40 anos de carreira, e presença frequente em edições passadas do Kool. Na exata hora em que subiram, o quarteto trouxe a responsabilidade em suas mãos ao elevar o ritmo, uma tarefa relativamente fácil e que foi imediatamente realizada.


O oitavo e único álbum com a maioria das músicas em Inglês, "Just Another Crime in... Massacreland", está completando aniversário de 30 anos (fato mencionado pelo próprio João Gordo durante o show), o que deu um toque especial neste show, tanto que a quarta faixa do álbum, "Satanic Bullshit", foi a escolhida para ser a abertura.


Como era esperado, eles desafiaram a capacidade da plateia em aguentar o desenrolar de uma destruição orquestrada pela banda, e mal deram tempo para que houvesse sequer a capacidade de respirar. A chegada da noite e com a metade do Kool já tendo ocorrido não foram obstáculos para que a audiência desconhecesse o significado da nomenclatura "cansaço", e isso foi evidenciado em ações.


A sinergia entre todos os membros era tão poderosa que parecia exalar uma aura entre o quarteto: era frequente a troca de posições dentro do palco entre Juninho e Jão, os dois lado a lado com João Gordo bem no meio, e tocando próximos ao baterista Boka, estando temporariamente virados para ele.


Ratos de Porão no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Ratos de Porão no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

"Alerta Antifascista" foi uma injeção descomunal de adrenalina, e usada como uma crítica pesada de natureza política. Compatível com a atmosfera do Kool (que encontra paralelos com o famoso festival Obscene Extreme, da República Tcheca), uma camisinha passeou pelos ares da casa, como se fosse uma bola de aniversário. O que fazia sentido, já que era a comemoração da pura felicidade pelos entusiastas do festival.


Felicidade esta demonstrada pelos sorrisos constantes dos 4 membros, ao ponto de João mencionar que era agradável ver "sangue novo" no meio do povo que ali estava, ao invés de ter só "tiozão". A icônica "Crucificados Pelo Sistema" fez com que a casa caísse ladeira abaixo, testando os limites de todos os equipamentos de som (que ficaram com uma ótima e estável qualidade durante o festival inteiro. Isso merece ser reforçado).


Com o repertório chegando ao fim, cortesia da elegante "Crise Geral", ficou claro do porquê do Ratos de Porão ser uma referência no Brasil, e dignos de um merecido reconhecimento internacional. Como o Rei Pelé antes deles, eles são alguns dos principais embaixadores do nosso país.


Toda aparição do Ratos de Porão no palco pode ser interpretada como a área incomum de Schrödinger: você sabe que estará fisicamente destruído, mas com um grau de felicidade ao ponto que as palavras falham em descrever.


Ratos de Porão no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Ratos de Porão no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Repertório


1) Satanic Bullshit

2) Bad Trip

3) Amazônia Nunca Mais

4) Farsa Nacionalista

5) Alerta Antifascista

6) Aglomeração

7) Morte Ao Rei

8) Ignorância

9) Lei do Silêncio

10) Morrer

11) Mad Society

12) Crianças Sem Futuro

13) Crucificados

14) Descanse Em Paz

15) Vídeo Macumba

16) Aids, Pop, Repressão

17) Beber Até Morrer

18) Crise Geral



Exhorder


Exhorder no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Exhorder no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

O padrão definido pelo Ratos de Porão sobre o quão intenso é o assalto sonoro que eles entregam em uma performance chega a ser intimidador até para os musicistas mais versados que precisam subir no palco após eles.


Quando estamos falando daqueles que são progenitores do "Groove Metal", porém, este felizmente não chega a ser o caso. Sendo também alguns dos que ajudaram a formar o "som característico de Louisiana", e apesar do Exhorder ter sido concebido em 1985, esta foi a 1ª vez em solo brasileiro nos quase 40 anos de existência.


Para a surpresa dos presentes, a performance foi executada de maneira que a audiência já era familiarizada com o som dos estadunidenses, como se eles já estivessem vindo para cá em oportunidades de um passado não tão distante.


A aparição da banda foi também num período estratégico, já que no exato mês seguinte, o mundo observará o lançamento de seu mais novo álbum: "Defectum Ominium", o quarto dos seus 39 anos. O que não excluiu a possibilidade de boa parte do repertório ser tomado pelos seus primeiros registros, "Slaughter In The Vatican" e "The Law".



Exhorder no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Exhorder no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Em uma velocidade muito rápida, foi perceptível que o frontman Kyle Thomas já estava com um certo domínio sobre o público, e quem estava no show, respondeu prontamente com uma interação que estava operando numa crescendo: os moshpits aumentavam gradualmente, as bangeadas de cabeça chegavam a uma velocidade quase maníaca, a capacidade da voz de todos estava sendo colocada em teste. Um pandemônio tomou conta do Carioca Club, e qualquer traço de civilidade da multidão estava temporariamente ausente.


O nome "Exhorder" passou a ecoar constantemente nos ouvidos da população aproveitando o festival, já que em pouco tempo, foi revelado que o que estava acontecendo não era um simples show, e sim algo similar a uma aula magna.


Um momento notável foi perto do final, quando a plateia fez coro o nome da banda como se fosse um hino, e houve um acerto não intencional de que a próxima faixa seria exatamente essa do álbum de estreia, "Slaughter In The Vatican".


Mesmo sendo a primeira aparição dos pioneiros do Groove em terra brasileira, esta foi uma oportunidade para que fosse um passeio pelo histórico da banda, além de uma declaração da potência que os mesmos possuem enquanto performam.


O Kool estava próximo do seu fim, mas ainda faltava algo. O incrível é que o público ainda tinha energia sobrando, e demandava um encerramento a altura. Todos mal podiam esperar o que estava prestes a chegar...



Repertório


1) Slaughter In The Vatican

2) Legions of Death

3) My Time

4) Year of the Goat

5) Forever And Beyond Despair

6) Exhorder

7) Desecrator



Vio-lence


Vio-lence no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Vio-lence no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

O cartaz do evento deu a entender que o Vio-lence seria a atração principal, e foi isso que aconteceu. Antes mesmo das primeiras notas serem tocadas, quando as cortinas foram reveladas com os membros da banda, a plateia soltava gritos alcançando até o limite das suas cordas vocais. Havia um motivo extra para isso: Phil Demmel estava indo para a banda solo de Kerry King, e teria que deixar o Vio-lence para isso acontecer. Eles nem precisaram prometer nada: só isso já era razão suficiente para que fizessem uma entrega com gosto de "quero mais".


Nos primeiros momentos de "Eternal Nightmare" (do álbum de estreia de mesmo nome do quarteto californiano), o clima que duraria até o final da apresentação logo foi estabelecido com uma tempestade de devastação pura, não se importando com quem poderia estar esgotado em pleno Domingo carnavalesco.


Vio-lence no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Vio-lence no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

Algo que merece destaque foi o nível inumano de animação do público. Selvageria era a palavra de ordem (ou melhor, desordem) que invadiu o local: como a pista não possuía grade para qualquer forma de separação, até mesmo quem estava colado no palco sentiu os empurrões vindos do moshpit no centro de algo que lembrava uma verdadeira arena de batalha. Moshpits esses que pareciam não ter um fim e com um volume mais do que espantoso.


Para além disto, a interação dos membros da banda merece outro destaque. O vocalista Sean Killian se aproximou quase o show inteiro do público, estendendo seus braços para os que estavam mais próximos do palco, ao se posicionar na plataforma com um degrau menor. Isso já era causa suficiente para que os stagedives continuassem.


Em certos momentos, demorando para pularem, era normal o próprio Sean empurrar com a perna para que o público pegasse quem subiu no palco, o que só fez acelerar a continuação de stagedives. Muitos ocorriam de maneira relâmpago, e atingiam quem estava distraído. Um desentendimento ou outro aconteceu por conta disso, mas nada de grave.


Vio-lence no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.
Vio-lence no Kool Metal — Foto: Eduardo Okubo Jr.

"Officer Nice" foi motivo para causar uma catástrofe (no sentido positivo), mas o que levou as coisas ao próximo nível foi quando um cover de Dead Kennedys foi tocado, a famosa "California Über Alles". Para o desenrolar desta, foram convidados a retornarem no palco o vocalista/guitarrista do Exhorder, Kyle Thomas, junto com o baterista Sasha Horn, auxiliando nos deveres vocais. O Carioca Club estava na iminência de sofrer um terremoto de pequena escala, pois o público apelou para os seus instintos mais primitivos.


O incrível é que o próprio Sasha também realizou alguns stagedives, pedindo gentilmente para a plateia segurá-lo.


A euforia da banda era visível no rosto deles, pois sabiam que seria uma noite memorável no bairro paulistano de Pinheiros, tanto que, perto do final, Sean mencionou que gostou do fato da turnê sul-americana terminar justamente em São Paulo, pois ele reconhece a energia e a empolgação da plateia brasileira (o que foi comprovado já nos primeiros minutos).


Repertório


1) Liquid Courage

2) Eternal Nightmare

3) Serial Killer

4) Phobophobia

5) Kill on Command

6) I Profit

7) Calling In The Coroner

8) Officer Nice

9) Upon Their Cross

10) California Ãœber Allies (com Kyle e Sasha, do Exhorder)

11) World In A World


E assim, o Domingo caloroso de Carnaval foi finalizado com uma temperatura fenomenalmente alta, seguindo o histórico do Kool em hospedar tanto bandas nacionais como internacionais, em crescimento e de conhecimento.


Não um simples festival, mas uma verdadeira comunhão da comunidade headbanger dentro do memorável Carioca Club. Seria normal questionar que ainda está para ser visto se o próximo Kool manterá o mesmo nível de intensidade que foi visto aqui. Considerando um público fiel que tem comparecido frequentemente, no entanto, uma experiência insana já é algo garantido nos próximos Kools que virão. Afinal, quanto mais Kool para todo mundo, melhor.

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